quinta-feira, 29 de outubro de 2009

CEPECA NO V CONGRESSO DA ABRACE

CEPECA

Como centro de pesquisa da Universidade de São Paulo, o objetivo principal do CEPECA é reunir, em grupo de estudos práticos sobre interpretação, professores, alunos de pós-graduação e interessados na área.

Metodologicamente, projeta-se a realização de um roteiro de trabalho que compreende a aplicação de ações, procedimentos e exercícios, decorrentes de projetos de pesquisa desenvolvidos por cada componente, visando resultados perceptíveis em trabalhos práticos e espetáculos.

A pesquisa deverá levar em conta as necessidades dos atores na composição do desempenho teatral bem como da criação cênica autoral. Neste sentido caminham juntos os aspectos acadêmicos e criativos, ou seja, professor e alunos se obrigam e se comprometem com os resultados estéticos, a partir de suas escolhas metodológicas. O CEPECA é um nicho para todos aqueles que procuram o aperfeiçoamento de suas técnicas, num fazer pensado, autônomo, rico em soluções para a cena e o que surge de cada processo criativo. As produções casam temas e pesquisas manobrando interesses individuais e o objetivo de experimentação para o espetáculo.

Desde seu início informal, a partir da necessidade de continuação na pesquisa em disciplina ministrada por Armando Sérgio busca sempre a integração de nós artistas-pesquisadores e sua viabilidade de projetos. Para tanto, adota-se uma política transparente que prepara as criações para o mercado, abrindo novas portas para o artista maduro.

Nos encontros, adota-se como procedimento-guia a demonstração e discussão dos trabalhos individuais ou em grupo num clima de descontração e seriedade onde todos podem opinar, desde que embasados.

Com sua oficialização no início do ano dentro do regimento interno da ECA e na Comissão de Pesquisa da Universidade de São Paulo, a empreitada ganha nova operacionalidade. Seu sucesso se mede não só pelos espetáculos concluídos e aumento do corpo de participantes, mas também crescimento pessoal e profissional oferecidos.

Coordenação: Prof. Dr. Armando Sérgio da Silva

Encontros semanais as quintas-feiras, das 9 as 14hs

Local: ECA/USP (sala 23 da artes cênicas)

E-mail de contato: cepeca.usp@gmail.com

BLOG: www.eca.usp.br/cepeca

Invasão de privacidade como processo de pesquisa e espetáculo.

Suzana Ferreira Alves

Cada corpo compõe sua memória. Seus registros são acionados por estímulos pulsantes da verdade de si próprio. Na arte o corpo reaparece com a forma que vivenciou e o que sobrou das experiências da memória. E dessa maneira que seleciono o material para as cenas. O que observamos na arte, o que assistimos, consumimos, do que nos alimentamos, o ambiente, as pessoas, nosso dia-a-dia. O corpo fixa e compreende, mesmo inconsciente, as informações, sustentando o que somos e nosso jeito de pensar e agir. O resgate existencial do corpo é a base da criação para minha pesquisa.

Apresentarei nesta noite duas cenas.

A primeira é um exercício corporal, quase uma cena, de experiências vivenciadas.

A segunda é resultante do material pesquisado na experiência pessoal.

Inicio a pesquisa escolhendo um anteparo; pode ser uma palavra, um fato que aconteceu, uma música que me trás um sentimento que quero resgatar, ou mesmo um objeto que lembra minha vida. Depois, uso o pilates como aquecimento, e entro com alguns passos do balé para resgatar a minha memória infantil. Durante todo esse processo de aquecimento, o anteparo que escolhi esta o tempo todo presente em minha imaginação, pratico o exercício simultaneamente, com todas as informações pré estabelecidas, e no final, começo a escrever a partir da respiração e ressonâncias alimentadas. No final, a parte da escrita, geralmente, surge uma nova historia, ou às vezes um poema, uma reflexão, ou um personagem, que é o caso da segunda cena que vou mostrar pra vocês. Os personagens são: Alice e as mãos… Era uma vez um par de mãos. Elas caminhavam muito bem até que um dia muito ensolarado… ela resolve parar e tomar um banho de sol. Mas estava muito quente, tão quente que acabaram se queimando, ficaram escuras até que em determinado momento começaram a formar bolhas e a se derreterem, por fim os dedos se deslocaram das mãos.No chão absorveram um formato congelado. Os únicos dedos que estavam congelados intactos, inteiros, que não foram derretidos eram os indicadores, o resto eram só dedos deformados e congelados. Todos juntos, como em uma sinfonia de congelados, começaram a dançar e cantar, quase que enfileirados como antes estavam quando pertenciam as mãos.


“Um olhar, um novo olhar, através de...”, a máscara uma possibilidade pedagógica.

Renata Ferreira Kamla

Com a máscara, sentimos subitamente uma força e uma segurança totalmente desconhecidas. Tendo o rosto oculto, recobra-se confiança e ousa-se o que nunca se ousaria com o rosto descoberto. A máscara impõe uma grande força e amplitude em cada movimento, exige movimentos completos e desenvolvidos até o fim, que tenham o mesmo caráter ponderado, regrado e forte, o mesmo estilo que a própria máscara. A máscara dá uma grande estabilidade e um sentimento forte de medida, e também uma espécie de consciência de si mesmo e do controle sobre si mesmo. Cada movimento se faz em relação à máscara. (COPEAU, 2000).

Esta pesquisa investigará a possibilidade da utilização das máscaras como um caminho pedagógico e facilitador para o processo de criação e formação do ator.

Pensando o teatro como uma manifestação artística que revela verdades, relacionando o ator com o mundo em que vive, com o outro e com o público num jogo permanente, percebemos, a presença do princípio ético, da comunhão, adaptação e verdade cênica, traçados por Stanislavski, em paralelo com a pedagogia de Copeau, do seu discípulo Jacques Lecoq e do professor doutor Armando Sérgio da Silva.

Para se desenvolver esta pesquisa faz-se necessário delinearmos paralelos, identificações e fusões entre esses referidos autores pesquisadores. A pesquisa tem como objetivo investigar a utilização dos diversos tipos de máscaras como ferramenta para a criação do ator, possibilitando através dos estados que elas provocam criar caminhos de construção de ações e vivências para o ator abordar as personagens de diversas dramaturgias e colaborar com o panorama da interpretação teatral atual.

Através de estudos práticos com um grupo de alunos-atores investigaremos o caminho máscara-personagem, personagem-máscara, estimulando a imaginação criadora. Analisaremos as pesquisas dos autores citados fazendo paralelos com a prática atual nas escolas de teatro e nos grupos de pesquisa com atores formados, procurando entender o porquê deste signo e o que representa como possibilidade pedagógica ao estudante de teatro hoje.

Acreditamos que possamos através da experimentação cênica do diálogo entre as máscaras e suas técnicas, provocar improvisos e descobertas, propiciando a consciência individual de cada interprete do seu processo metodológico de criação, traçando um novo olhar. A máscara como fio condutor de pulsão e energia. Afetando e sendo afetado.

O Ator-Criador-Compositor-Pesquisador

Umberto Cerasoli *

pesquisa financiada pela FAPESP

A partir da década de noventa, observa-se no Brasil o “retorno” do ator ao centro da criação nas companhias teatrais brasileiras. Após um período de primazia do diretor e do aspecto visual no espetáculo, as atenções voltam-se para o ator não apenas durante o ato cênico, mas também no espaço de criação, no seu contínuo desenvolvimento técnico, na autoria da obra e na manutenção da companhia (FISCHER, 2003, p.77).

Inserido no contexto de retomada do teatro de grupo no Brasil (onde novas linguagens são criadas com base na ideia de “colaboração” e de “obra em processo”), o ator começa a interferir diretamente não apenas na representação (sua especialidade), mas em todas as vertentes da criação cênica; e seu papel passa de executor de funções pré-estabelecidas pela dramaturgia e pela direção, para principal vetor da criação artística – fato que eleva o seu status à categoria de “co-autor” da cena.

Na tentativa de melhor definir a abrangência da interferência deste “novo ator” sobre a autoria da cena contemporânea, surgem os conceitos de: ator-criador, ator-autor e ator-encenador. Para especificar os procedimentos que atribuem ao ator o status de criador, surge a definição de ator-compositor. E, para denominar o ator cujo trabalho é voltado primordialmente para o desenvolvimento de metodologias para a formação do ator, é proposto a definição de ator-pesquisador.

Minha pesquisa junto ao CEPECA propõe analisar o conjunto destas definições, a fim de mapear os novos caminhos e especificidades que a prática teatral tem proposto para o trabalho do ator. Pensar as fronteiras do trabalho do ator, hoje, é importante para o CEPECA, pois, enquanto Centro de Pesquisa em Experimentação Cênica do Ator, estes conceitos não só perpassam a maioria de suas pesquisas, como constituem exatamente o fundamento de suas práticas.

Bibliografia CitadaFISCHER, Stela R. Processo colaborativo: experiências de companhias teatrais brasileiras dos anos 90. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas/SP: 2003.

(*)Umberto Cerasoli Jr é formado em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da USP, é mestrando em Teatro pela Escola de Comunicação e Artes da USP, com o projeto O LUME no contexto de teatro de pesquisa do séc.XX (sob orientação do prof. Dr. Clóvis Garcia.e integra o CEPECA (Centro de Pesquisa em Experimentação Cênica do Ator) desde 2008.


O Ator Musical: a musicalidade como eixo central na composição cênica

Carlos Eduardo Souza Brocanella Witter

Orientação: Prof. Dr. Armando Sérgio da Silva

Atores: Lívia Figueira, Luiz Rodriguez, Nathaly Franzosi, Raoni Garcia e Letícia Chiochetta

A musicalidade está presente em tudo o que fazemos e provoca reações orgânicas internas e externas. É inerente ao ser humano essa condição, enquanto ser musical que é.

Nosso mundo é formado por sons. Qualquer coisa que se mova e vibre mais de dezesseis vezes por segundo produz som audível. Essa variedade desenha uma paisagem sonora que, conforme Fábio Cintra, é um todo que articula som e silêncio, em uma duração variável. Um livro caindo não chão tem musicalidade se nos conscientizarmos que a ação de largá-lo no chão traz em si a questão do tempo-rítmo., velocidade-intensidade, sonoridade.

No teatro não é diferente, podendo a musicalidade interferir tanto na elaboração de partituras, quando na composição das personagens. Existem várias possibilidades para que isso ocorra, nesta pesquisa elegemos três vertentes: a) a questão do tempo ritmo e da musicalidade do movimento; b) a questão de sua influência na composição de partituras, personagens, cenas ou espetáculo (música como anteparo); c) a questão da musicalidade gerada pelo ator a partir de improvisações e jogos ou de seu repertório conscientemente construído.

Para podermos chegar a isso, partimos da estrutura proposta pelo prof. Armando Sérgio que esquematiza o trabalho do ator em 3 momentos: ação (desvendar o objeto), impressão digital (criar o objeto pela mente e corpo do ator) e composição dos signos (transformar esse objeto em um signo articulado para percepção do espectador), para realizar um trabalho que tenha como foco central a musicalidade.

Num primeiro momento iremos construir e aplicar diversos jogos teatris musicais, a fim de instrumentalizar o ator para a cena, ampliando seu repertório e consciência das sonoridades que o envolvem e da musicalidade de seus movimentos, bem como daquela que pode desenvolver em cena.

Nesta apresentação para a ABRACE, utilizamos a música Batimacumba dos Mutantes, permitindo que ela fosse a geradora do trabalho do ator e da composição cênica da primeira cena da peça Kaos, de Millor Fernandes. A partir daí pudemos perceber que cada um dos atores envolvidos sofreu uma influência particular que possibilitou-o iniciar essa construção pessoal e que o fato de partir de jogos, da música e da musicalidade, resultou na presença do ator em cena, antes mesmo de se pensar a personagem.

Este é apenas um embrião de nosso trabalho, que pretende mostrar os resultados e processos no trabalho do ator que tem na musicalidade seu eixo central de composição


O CORPO CÊNICO E A MÍMICA CORPORAL DRAMÁTICA DE ETIENNE DECROUX - Reflexões para Abordagens Contemporâneas

Laura Kiehl Lucci - Orientação Prof. Dr. Armando Sérgio da Silva

Objetivo da Pesquisa : Apontar caminhos pessoais de apropriação da Mímica Corporal Dramática(MCD), criada pelo francês Etienne Decroux (1898-1991), como um meio para chegar em um corpo cênico, ampliando a consciência poética do ator.

Conclusão da Pesquisa

A Mímica Corporal Dramática possibilita ao ator:

Consciência corporal:corpo cênico

Entendimento do corpo como pensamento

Entendimento e utilização do corpo como signo

Meio para criação

Ampliação da consciência cênica e aquisição de uma poética pessoal

¨O Jogo com Anteparos: Uma Intersecção Metodológica¨

Rejane Kasting Arruda

Pesquiso a atividade criativa do ator. Utilizo a noção de jogo formulada por Viola Spolin, fundamentada em instâncias essencias, a saber: a divisão do foco, a resolução do problema e a regra. Proponho uma intersecção: que o ator jogue com anteparos. Anteparo é uma instância originária da chamada Oficina da Essência, desenvolvida pelo professor Armando Sergio, na USP, durante os anos de docência. São bens simbólicos (estórias, imagens vocais ou visuais) ou objetos do cotidiano com os quais o ator ¨triangula¨ (improvisa) antes de criar a partitura cênica, ¨se protejendo de formalizações precipitadas¨ (anteparo que dizer proteção) (1). Ou seja, o anteparo não é partitura, mas elemento em jogo. A sua presença como regra institui o jogo. A principal analogia é, ainda, com o jogo tradicional: uma regra implica risco, perigo, desafio, aventura, prazer e entrega, justamente porque, quando o jogo começa, não temos a resultante (esta será produzida de um improviso, conduzido e orientado pela regra). Por exemplo, para demonstração de trabalho na ¨V REUNIÃO CIENTÍFICA DA ABRACE¨ utilizo o seguinte anteparo.

Ela toca seu próprio umbigo, diferentes pontos dos seios, ventre, rosto e topo da cabeça, como se tentasse sentir-se; a mão esquerda belisca o pulso direito, as mãos vão até o topo da cabeça e a esquerda emputra o antebraço direito para baixo. Corre então de volta ‘a esquerda baixa, pausa como antes, sendo seguida por Minarik. Assim que Minarik toca seus ombros como antes, ela cai, rola para sua direita, para sua esquerda (...). (2)

Há diferenças. Na medida em que estou só, ¨assim que Minarik toca seus ombros como antes, ela cai¨ define um problema a resolver (instância de Spolin) e crio, como resultante, ¨tapas na cara¨ (com a própria mão estapeio as faces antes de ir ao chão). Na medida em que o externo é a resultante, o anteparo se posiciona como elemento interno que divide o foco. Com esta hipótese, desenvolvo uma espécie de ¨concorrência pelo Foco¨ ao jogar com outros anteparos (por exemplo, uma fala interna) (3). Assim, crio um jogo interno-interno (de atrito, ocilação). Na medida em ocilo (e há, inclusive, a perspectiva da desobediência ao anteparo), abro perspectivas de ¨variações externas¨. Há a necessidade da ¨tomada de posição¨ no momento do jogo, repentinamente sentida como surpresa e impulso: ¨surgem tapas na cara¨.

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1. Ver em SILVA, A. S. Interpretação: Uma Oficina da Essência. Tese de Livre Docência, USP-ECA, São Paulo, 1999.

2. FERNANDES, C. Pina Bausch e o Wuppertal Dança-Teatro: Repetição e Transformação. SP: Annablume, 2007.

3. O termo fala interna foi elaborado por Kusnet e é originário do ¨monólogo interior¨ de Stanislavsky. Não a articulo pelo viés do ¨pensamento da personagem¨, mas de uma ¨questão íntima¨. Minha fala interna neste jogo é ¨cada hora é um (homem) gente que coisa doida¨. Memorizada pela repetição da escrita (bem como a descrição do anteparo), ela expressa a minha estupefação diante do que Nelson Rodrigues inscreve em Minha Vida (de Susana Flag), meu estímulo inicial.

O ator no olho do furacão – um olhar para o trabalho criativo do ator” José Eduardo de Paula

O ar, elemento dinâmico da natureza, pode ser compreendido em suas distintas manifestações: calmaria, aragem, brisa, vento, ventania, tempestade e furacão. Cada uma delas possui aspectos reveladores de temperaturas, intensidades, vetores e outros sistemas complexos, denominados “sistemas de alta e de baixa pressões atmosféricas” (KOBYAMA, 2006, p.20 e p.72).

Supomos que os aspectos contidos nestas distintas manifestações do elemento ar, sejam portadores de “metáforas” (LAKOFF & JOHNSON, 2007) potentes o suficiente para nortear e estabelecer analogias capazes de impulsionar o trabalho criativo do ator “nas bases orgânicas da natureza” (STANISLAVSKI, 1982, p.45).

Com base nas análises de quatro escalas utilizadas pelas Ciências Atmosféricas para categorizar os “eventos naturais” 1, mensurar “perigo e risco” 2, classificar “furacões” e associar “diferentes tipos de estágios do estado do mar e a intensidade dos ventos [...] enumerando as diversas intensidades” (KOBYAMA, 2006, p.62), selecionamos três aspectos principais para relacionar com o trabalho do ator: intensidades, estados e velocidades. O primeiro, entendido em termos de “força”, modifica-se gradualmente do mínimo ao máximo, em uma escala de esforço que parte do ‘0’ (zero) ao ‘12’(doze). As descrições do segundo variam da calmaria ao furacão, passando pela aragem, brisa, vento, ventania e tempestade, relaciona as sensações provocadas pelo ar manifesto com as emoções de tranquilidade à fúria, encontrando, desta maneira, correspondência com os distintos estados psicofísicos. Por último, a velocidade, que vai do 0 km/h a mais de 118 km/h, encontra ligação com o ritmo – das ações físicas, da cena, do espetáculo. As analogias entre os aspectos intensidades, estados e velocidades do elemento ar, com os princípios força, estados psicofísicos e ritmo, norteadores do trabalho de criação do ator, se estabelecem via metáfora, pois nela reside a possibilidade de “entender e experimentar um tipo de coisa em termos de outra” (LAKOFF & JOHNSON, 2007, p.42).

A partir destas relações, acreditamos ser possível encontrar, discutir e definir outras metáforas capazes de nortear analogias entre a os aspectos contidos nas distintas manifestações do elemento ar e o trabalho de criação do ator.

(Footnotes)

1 Escala Burton, in, Kobyama, 2006, p.19.

2 In, Kobyama, 2006, p.28.

Cartografia de um Corpo em Cena: Extração e Codificação de Matrizes

Corporais através do Método Body Mind Centering®”

Débora Zamarioli

Introdução

A pesquisa teve como foco o corpo do intérprete em criação, suas abordagens, reflexões e métodos destinados à construção cênica. Utilizei princípiops do método de educação do movimento, Body Mind Centering® (BMC®), como procedimento metodológico, o conto “Amor”, de Clarice Lispector, como proposta de caminho específico para criação de personagem e situação dramática, e as formas de extração e codificação de matrizes corporais estudadas por Renato Ferracini.

Objetivos :Estudo dos sistemas corporais, ligação entre mente e corpo e interligação entre todos os sistemas, adquirindo uma consciência mais profunda sobre as camadas do corpo em sua totalidade;

· Habilidade de perceber processos internos do corpo como aspectos relevantes da prática da criação cênica;

· Codificar e transformar em material cênico e teórico as sensações percebidas durante o processo;

· Construção de “personagens”, personas, figuras através da exploração e refinamento da percepção corpórea;

Desenvolvimento

FASE 1: DESVENDAMENTOS – Estudo minucioso do texto. Extração de palavras- matrizes. Escolha de anteparos.

FASE 2: IMPRESSÕES DIGITAIS – Improvisações a partir dos sistemas ósseo, orgânico, muscular e endócrino. Extração e codificação de matrizes ósseas, orgânicas, musculares e endócrinas.

·FASE 3: COMPOSIÇÃO DE SÍGNOS – Criação do roteiro de “Ana-me”, resultante espetacular da pesquisa.

Conclusão

Antes de ser uma técnica, o BMC® é uma prática que corporifica a observação, a atenção, a intenção e a ação. O conhecimento produzido por essa prática pode ser utilizado em técnicas de interpretação existen­tes, pois trata-se de alinhar intuição e forma, percepção e ação. Nada é excluído, tudo é observado, acolhido, sentido e “agido”. No processo cênico em BMC®, o corpo-subjétil se pensa e se lança na corporificação de suas próprias multiplicidades. Cabe ao ator, tomar consciência dessas diferentes expressões, e extrair resultantes que funcionam como marcas, materializações, catalisadores, tram­polins dos bens imateriais atorais. É através da análise sobre essas resultantes que o ator pode perceber seus limites e suas trajetórias, e traçar novos objetivos com novas escolhas.

Bibliografia de Referência

ARTAUD, Antonin. O Teatro e seu Duplo. Trad. Teixeira Coelho. São Paulo: Martins Fontes, 1999. Coleção Tópicos.

COHEN, Bonnie Bainbridge. Sensing, Feeling and Action: the Experimental Anatomy of Body-Mind Cente­ring. Northampton, Massachusetts: Contact Editions, 2008.

FERRACINI, Renato. Café com Queijo: corpos em criação. São Paulo: Aderaldo & Rothschild Editores, Ed. Fapesp, 2006.

O AIKIDO E A POESIA CORPÓREA DO ATOR

Renata Mazzey Batista

Nesta pesquisa buscamos atingir os seguintes objetivos:

1. Desenvolver um treinamento recorrendo aos princípios e técnicas do Aikido que permitissem ao ator o autoconhecimento e o aprimoramento corporal.

2. Elaborar procedimentos que permitissem ao ator ampliar seu repertorio criativo, oferecendo recursos para a construção de partituras físicas.

3. Preparar um espetáculo que tornasse visível os elementos pesquisados.

1- O AIKIDO – CONCEITO : O Aikido tem como aspecto primordial a não utilização da força muscular excessiva para afastar um ataque, ocorrendo a defesa a partir do aproveitamento da energia proveniente deste ataque para neutralizá-lo por meio de movimentos esféricos.

2- CONTRIBUIÇÕES DO AIKIDO PARA O TRABALHO DO ATOR: Este trabalho foi dividido em duas fases: a preparação e a criação. A primeira foi a fase de treinamento aonde os exercícios foram desenvolvidos focando a prática e o aprimoramento das técnicas selecionadas, a flexibilidade, a conscientização corporal e o condicionamento físico. Na fase de criação, o repertório adquirido na etapa anterior foi utilizado focando a experimentação criativa, objetivando a construção do espetáculo. Foram abordados os seguintes aspectos do Aikido:

- respiração- o trabalho com a respiração objetivou o estímulo das emoções e a execução dos movimentos com maior eficiência;

- articulações- por meio do uso das articulações objetivou-se despertar o corpo para novas movimentações como as torções que dão tridimensionalidade para o movimento.

- Koshi (quadril). Esta parte do corpo tem fundamental importância no Aikido, assim como nas artes teatrais orientais, pois representa o centro de gravidade do corpo e é de onde flui a energia para as extremidades.

- Esfericidade – as técnicas do Aikido obedecem trajetória esférica, a fim de aproveitar a energia cinética do atacante contra ele mesmo, resultando em movimentos fluidos

- Equilíbrio e desequilíbrio-foram explorados a posição estável de quem aplica a técnica (nage) e o estado de desequilíbrio e instabilidade de quem recebe a técnica (uke).

Dramaturgia de uma nau de loucos: uma possibilidade cênica

Evinha Sampaio

Este processo criativo parte do movimento do corpolouco, corpo do louco, morador de rua de São Paulo. Um corpo que, aos nossos olhos, parece criar e executar movimentos que seguem um fluxo neurológico diferente dos nossos corpos sãos, mas não sabemos se esta hipótese é verdadeira.

Contudo podemos afirmar que, apesar de tantos estudos sobre o movimento, ainda não se tem certeza onde ele se inicia dentro do corpo. Segundo a neurociência e a Teoria do Corpomídia (Christine Greiner - Helena Katz), um dos pilares teóricos desta pesquisa, o nosso corpo não age dentro de um sistema causal (causa-efeito), mas processual, em uma rede de acontecimentos, em transformação permanente de re-atualização. Sem fim. Mesmo depois da morte, qualquer corpo sofre o processo de decomposição.

Do ponto de vista da Teoria do Corpo sem Órgãos (Artaud-Deleuze), outro ponto de apoio, podemos, talvez, afirmar que o movimento do corpolouco é diferenciado, porque atua sem a censura dos corpos com órgãos. Ele é livre, até certo ponto, e não percebe a diferença entre o espaço público e privado. O corpolouco se movimenta livre das regras sociais.

Para criar o espetáculo de teatro-dança, que estou propondo, sob a orientação do prof. dr. Armando Sérgio da Silva, vou observar o movimento do corpolouco, repeti-lo, devorá-lo, criar uma partitura e levá-la às últimas conseqüências, permitindo que nesta fissura eu descubra as linhas de fuga de criação (Deleuze). Neste lugar, voz, emoção e sentimento vão ser introduzidos, para a criação da dramaturgia cênica.

No processo criativo, a dança contemporânea auxilia na soltura da partitura, para que esta não fique rígida, fria. Desejo encontrar o fluxo do não raciocínio, o fluxo do movimento livre no momento da criação. Outros anteparos - sonoros, visuais, literários, musicais ... – apoiarão as descobertas das microcenas. Forma e conteúdo do espetáculo vão aparecer durante o processo criativo.

Outros colaboradores do processo: Helena Katz, Gina Monge e Rosa Hércoles.

Contato: mebarea@usp.br e mebarea@gmail.com – Evinha Sampa