terça-feira, 29 de julho de 2014

NOSSO PAI DE TODOS OS DIAS...



Nosso pai maior é Deus. A parábola que Ele escolheu para o início do cristianismo, enviando seu filho para salvar a humanidade é exatamente o que os pais tentam fazer com seus filhos, ou seja, trazê ao mundo criá-los e educá-los de maneira que possam melhorar um pouco o lugar em que vivem.
Falemos então de um “Pai Nosso” terreno...
Meu pai que está aqui junto de mim...
- Quantas noites, quando era bebê não gritei na solidão do meu berço e a minha mãe, junto com meu pai, vieram me abraçar e beijar. Quantas noites adoentado meu pai passou em claro medicando me, tirando minha febre o tempo todo. Brincamos muito de circo, de espada, de futebol, de subir em árvores. Lutamos com os travesseiros, pulamos em cima da cama. Nessa fase, na infância, ele é o nosso herói. Observamos atentos cada atitude, cada gesto. Essa observação aguda vai formar o nosso futuro caráter. Todas as vezes quando eu tinha algum probleminha lá estava ele, ponderando, aconselhando e me deixando tranquilo. Na adolescência seu sono era atrapalhado por outras coisas. Levar-me na balada, quando eu pedia para me deixar longe da porta, para parecer aos meus amigos que eu ia sozinho. Depois ir me buscar de madrugada. Quando chegávamos em casa invariavelmente encontravamos minha mãe sentada na sala à minha espera.
Dignificado seja o seu nome em qualquer lugar deste vasto mundo...
Quando fiquei adulto senti no seu olhar a satisfação por ter cumprido a sua tarefa, que era tornar-me um homem de bem. Todos os seus sacrifícios, eu percebia por seus olhares, que não tinham sido em vão. Era o que ele queria que o nome do seu filho fosse respeitado assim como o seu havia sido.
Que nos seja dado hoje e sempre o prazer da sua companhia... E que a gente possa satisfazer suas vontades...
Aos poucos fui sentindo que você era menos herói, mas muito mais humano e compreensível, mais humilde, menos dono da verdade e fui sentindo a necessidade de retribuir todo o seu carinho e sua proteção do passado. Era preciso agora alguns cuidados para manter a sua presença. Insistir para você ir ao médico, tomar agora os seus remédios, da mesma forma que você  deu quando eu era criança. Às vezes chamar a sua atenção e até repreendê-lo.
Peço perdão por ter sido às vezes tão irreverente, tão impaciente...
Por não ter ouvido alguns de seus conselhos. Insistir em dirigir o carro sendo menor de idade. Trançar-me no quarto e ficar sem falar com você por dias. Achar que você estava ficando “por fora”. Por não entender a lentidão da velhice. Assisti a um vídeo que me mandaram por email que demonstra muito bem essa impaciência. O pai já bem idoso sentado num banco de jardim, ao lado do filho adulto que lê um jornal. Um pássaro pousa perto e o pai pergunta umas três ou quatro vezes para o filho – O que é aquilo? O filho acaba perdendo a cabeça e grita com o pai para ele parar de perguntar. O pai levanta-se vai até a casa e trás um diário aberto. Pede ao filho - Leia em voz alta! O filho então lê: Meu filho tinha três anos. Estávamos no jardim, quando um pássaro pousou.  Meu filho perguntou o que era aquilo por vinte e três vezes... Eu respondi por todas as vezes e em cada resposta o abracei carinhosamente. O filho chora e abraça com força o pai idoso. 
Assim como eu te perdoo por algumas injustiças que você fez comigo...
As suas broncas na hora errada, palmadas sem necessidade, falta de tempo para ficar junto.
Não me deixe ir para caminhos errados e...  Que Deus me livre da sua ausência...
Agora que você resolveu ir embora... Agora que você me deixou sozinho... De onde você estiver, por favor, continue a cuidar de mim como sempre...
Agora que eu sou pai estou querendo ser como você me ensinou. Não é fácil! No mundo violento de hoje, sinto que está cada vez mais difícil, proteger os nossos filhos. Temos que deixa-los fazer seu próprio caminho, conforme nossa orientação. Sinto-me, mais ou menos, como a águia que, num determinado momento empurra seu filhote do alto da montanha para que aprenda a voar. Acho que eu consegui, modéstia a parte. Por isso, tomo a liberdade, caro leitor, de transcrever um trecho de um texto dedicado a mim há alguns anos atrás.
“Meu pai é um exemplo para mim. Guio-me por ele com a segurança de que estou no caminho certo (...). A cada conversa sua serenidade me acalma como um abraço gostoso (...). Desde pequeno foi assim, mesmo sem eu saber... Por isso meu pai é meu professor. E por isso acho que o professor é uma pessoa que vive dentro da gente... Obrigado pai, meu professor mais importante!”
Obrigado vocês, meu filhos... Leandro...Sandro e... Ana Cândida!
Amém!
Armando Sérgio da Silva
   Inverno de 2014

segunda-feira, 14 de julho de 2014

O QUE É QUE EU VOU DIZER PARA OS MEUS NETOS?




Anos 50. Mogi das Cruzes...
Sábado seis horas... Serginho olha para sua cama e vê o terninho, azul marinho, de calças curtas limpinho estendido ao lado da camisa e meias brancas que sua mãe separara durante a tarde. Destino: Praça Oswaldo Cruz... Os pais e seus amigos vão bebericar alguma coisa no bar do Lanche ou no bar Cruzeiro. Serginho espera sentado num banco do jardim observando a grande tradição de Mogi das Cruzes... O “footing” dos jovens. Quando chegava a hora do cinema, aos sábados, Serginho e seus pais iam ao Cine Avenida. Iniciava-se o grande desfile pela Avenida Voluntario Pinheiro Franco. Quase todos se conheciam, vizinhos, parentes, amigos, colegas de escola.
Interessante é que o dono do cinema morava ao lado do mesmo e ficava sempre entretido vendo seus espectadores chegarem.
Era um cinema luxuoso, muito grande. Lá a festa continuava... Como todos se conheciam, na fila da bilheteria se cumprimentavam e na sala de espera, conversavam.
Os meninos sentavam-se sempre na primeira fileira e se deixavam levar pela magia do cinema.
Naquele dia o cinema inteiro chorou... O filme... “Imitação da Vida”. Enredo... Uma filha que renega sua mãe negra. Foi a maior lição de antirracismo que Serginho teve em sua vida. Serginho aquela noite demorou em pegar no sono... Antes de dormir jurou... Jamais vou discriminar alguém de outra cor. Depois fechou seus olhinhos e continuou sonhando como fizera no cinema.
ANOS 60. Mesma cidade
Domingo: Mais uma vez, tudo organizado sem ninguém organizar... As roupas eram as mesmas, os sorrisos e os flertes também, entretanto agora, como num corso, os rapazes e as moças iam a vinham na Dr. Deodato. Tudo isso acontecia antes do sagrado cinema.  O cine Urupema, que era deslumbrante, dizem que tinha mais de mil poltronas. Seu salão de espera, enorme, mais parecia um salão de baile com fotos dos artistas da época: Elizabeth Taylor, Montgomery Clift, Clark Gable, Kim Novak, Marlon Brando, etc. Entretanto cinema também era lugar para se namorar. Sergio e sua namorada brincaram muito de serem a... Deborah Querr que o Gregory Peck. No final da sessão, muito engraçado, as pessoas demoravam certo tempo para se desligar das personagens. Os rapazes com um andar inequívoco de “Cow Boy” ou dançando qual Gene Kelly, além de realçarem seus topetes de Tony Curtis. As moças com boquinhas de Kim Novak ou postura de Ingrid Bergman.
2014... Aqui mesmo.
Sr. Sérgio está sentado em uma poltrona confortável na sua mesa de trabalho. Lembra-se dos tempos em que a cidade vivia a cultura dos cinemas Eles, em Mogi das Cruzes, eram templos iluminados num tempo em que aqueles que os contemplaram jamais esqueceram. Lado a lado os mogianos desfilavam pelas ruas da cidade... Todos moravam no centro ou muito perto... Eram ternos gravatas, tecidos que mais pareciam para festas de gala. Não havia grande diferença de poder aquisitivo. Mesmo os mais pobres tinham ternos e vestidos dignos de fim de semana. Carros, quase, não se via. Observa fotos antigas: O cine Odeon com suas sessões somente para a criançada aos domingos pela manhã. O cine Parque com seus portões maravilhosos de ferro. O cine Vera Cruz, pequeno, mas muito confortável...  Sua esposa, ao lado lê um livro. Seus três netos digitam em tablets.
Um dos netos pergunta: Vovó, podemos ir passear na Dr. Deodato?
A avó abaixa o livro responde de pronto: Não. É muito perigoso. Está cheio de marginais lá à noite.
Outro neto: Então podemos ir ao cinema?
Sr. Sérgio: Não existem mais cinemas por aqui.
Neto: O que? Não acredito.
Sr. Sérgio: Infelizmente é verdade meus netos! Só se formos para Suzano ou Guarulhos.
O outro neto deixa o tablet e liga a TV no “Zorra Total”.
     Sr. Sergio e sua esposa, envergonhados, sorriem com tristeza, para os netos.                                                       THE END
Armando Sérgio da Silva
    Junho de 2014

PS: No momento em que estou escrevendo esta crônica leio nos jornais que o Cine Belas Artes vai ser reativado. Parabéns São Paulo!