sábado, 8 de agosto de 2015

AS MÁSCARAS



AS MÁSCARAS

          Quem diria? Estamos em pleno mar selvagem. Porque quem pensa que o que importa é o importante está fadado a se dar mal. A verdade é que ninguém conhece mais ninguém e se aparecer alguém de verdade, alguém tremerá de medo do outro lado. As personagens que todos gostam estão aí, nos shoppings, nos filmes americanos de ação, nas telenovelas, nas propagandas...Outro problema daqueles que fracassam é a mania de inventar personagens e máscaras. Então, o rio de dinheiro, que se gasta atualmente nas pesquisas de opinião pública afim de que nasçam personagens interessantes, capazes de satisfazer o sonho de qualquer ser humano, deve ser desprezado? Os heróis atuais não têm mais nada de introspectivos, ou de profundidade psicológica. São pessoas que não pensam e falam muito pouco, mas agem através de movimentos rápidos e certeiros. Pensar, na verdade, atrapalha a ação. A personagem moderna é capaz de, numa fração de segundo, arrancar os olhos e decepar um braço do desafeto, enquanto tem relações sexuais com três louras, duas morenas e uma ruiva. O cinema americano de grande bilheteria disse isto e se ele disse, ele disse e pronto. Vejam as filas, os rostos das crianças e dos adultos, as fantasias dentro das lojas, as bocas comendo carne e queijo derretido dentro dos Mac Donalds sempre lotados, o mundo criado a custa de muito dinheiro. Se o capital disse, disse e pronto.
Pulando de gato para cachorro estou agora me lembrando das campanhas eleitorais para presidente da república de 1989, a primeira direta após a ditadura militar. As equipes de comunicação criaram as personagens, porque sabiam que, principalmente na TV, tudo teria que se transformar em um show de máscaras e de representações exemplares. Alguns amigos meus tentavam descobrir qual seria o melhor presidente para o nosso país. Eu lhes disse: - Bobagem,  boa ou má vai ganhar a personagem, cujo ator tiver o melhor desempenho teatral. Dito e feito, aos poucos as máscaras foram desfilando pela tela, Um deles tentou criar a máscara do esquecimento, daquele que sofre de amnésia. Mudou os óculos, passou gumex no cabelo, virou garoto propaganda, mudou o tom do discurso enfim, ficou mais “clean”. (Paulo Maluf). Poderíamos chamar sua personagem de “o ingênuo”. Outro criou a máscara do professor, sempre com conceitos muito bem articulados e coerentes. Como todo mestre parecia saber mais do que todo mundo, o que o levou várias vezes a posar com certo cinismo de conhecimento (Mario Covas). Ah, quase me esquecia de um outro tipo “cantor de tango” que, num grande momento, chorou.(Brizola). Esqueceram-se também de que o público não está afim de qualquer melodrama. Enfim, todos acabaram ficando por ali mesmo. Talvez a grande surpresa foi o conteúdo irreverente de um personagem que apenas disse o seu nome.(Meu nome  é Enéas).

          Para o segundo turno foram os melhores atores e as personagens mais dramáticas. De um lado o herói popular, que veio de baixo, o comprometido com a ralé até os ossos, a força salvadora que perdeu dedos na máquina que o explorou, um digno representante do sofrimento do todo um povo explorado. Um forte candidato, um ator com o físico ideal para o papel e com uma fala muito parecida com a do povo. Quase ganhou. Perdeu por pouco. Ganhou quem? Ganhou o óbvio. O alto, o forte, o que usa gravatas caras e bebe as mais finas bebidas. Aquele que é capaz de lutar karatê no Japão, de jogar futebol na Itália e de fazer Cooper na Alemanha. Aquele que num dia de chuva abriu a camisa e gritou para as montanhas – Me mate se tiver coragem! Ganhou aquele que teve o gesto do punho fechado fortemente para os céus. Aquele que disse eu faço, eu farei, e sempre farei. Aquele que começava o seu horário copiando o início dos filmes do super-homem. O caçador de marajás, segundo os brasileiros e o caçador das esmeraldas segundo o presidente dos U.S.A. Ganhou aquele que entendeu a mensagem do Spielberg. Ganhou o herói que nós na verdade não somos, mas sonhamos ser. Ganhou o Rock, misturado com o Indiana Jones e o Rambo. Ganhou o óbvio, ganhou o representante daqueles que manipularam os nossos sonhos, ganhou o melhor ator e... Que Deus nos ajude! O resto... Bem o resto todo mundo já sabe. Na medida em que exerceu a presidência sua personagem foi enfraquecendo e de herói passou a ser um humilde vilão deposto pelo congresso. De Batman virou Coringa!
                                                 Armando Sérgio da Silva
                                                           Outono de 2014






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