sábado, 8 de agosto de 2015

SORTE DE MOGI DAS CRUZES



SORTE DE MOGI DAS CRUZES

1920, Kiev, Rússia frio arrastador a família judia janta na sala. A primeira guerra mundial ainda tem seus efeitos maléficos. A revolução Russa assusta os habitantes da cidade. A mãe olha para seu filho adolescente de 17 anos e pensa. – É melhor perder meu filho vivo! Preciso tirá-lo daqui.
- Filho você precisa sair daqui. Para um moço da sua idade a Rússia está muito perigosa e sem perspectivas. Ouvi falar de um país na América do Sul, que me parece muito bom... o Brasil.
– Eu vou sentir muitas saudades de vocês, mas eu tenho que ter coragem.
Dias depois de uma longa viagem de navio o jovem desembarcou no Rio de Janeiro e de lá seguiu de trem para São Paulo. Tinha por rumo Jacareí. Cansado adormeceu e a estação passou sem que ele descesse. Sorte de Mogi das Cruzes. Desembarcou aqui. Uma família mogiana de judeus lhe deu abrigo e um emprego. Como todo imigrante passou muitas dificuldades. Ia todos os dias na padaria e procurava o que havia de mais em conta. Para economizar, ele almoçava só um filão com duas bananas.
Num belo dia teve uma ideia. Comprar uma bicicleta e sair vendendo mercadorias de porta em porta. A ideia foi muito boa. Aos poucos o jovem começou a guardar algum capital. Faltava-lhe, entretanto, o amor, uma garota que lhe completasse a existência.
Estava ele um dia, de bicicleta, vendendo seus artigos quando ouviu o som maravilhoso de um piano. Percebeu que vinha de uma bonita casa que estava com as janelas abertas. Naquele tempo as janelas viviam abertas. Não resistiu foi até a casa e olhou. Tocava o piano uma jovem linda. Sem pestanejar deu-lhe os parabéns. Depois de um leve susto, ela o olhou. Os dois se olharam por instantes. Naqueles olhares já havia quase que um compromisso. Iniciaram ali um namoro escondido do pai da garota que não permitia que ela namorasse. O pai era de alta patente da Guarda Nacional e um próspero comerciante.
Casaram-se anos depois. O jovem russo acabou por ser aceito pelo sogro e iniciaram uma família. Aos poucos os negócios do jovem foram prosperando.
Nessa época, anos quarenta, aconselhou o sogro, para que se associassem para a formação de uma companhia cinematográfica. Acabaram por construir três cinemas dentre os quais um majestoso, com 3600 lugares considerado o maior cinema do Brasil.
O casal teve dois filhos que passaram a ajudar nas tarefas dos cinemas. Esse trabalho provavelmente os transformou em cinéfilos. Não era para menos n                                                                                                                                                                                                                                                               o cinema maior, logo na entrada, iluminadíssima, sentia-se o clima da magia. Os proprietários sempre por ali. Seu salão de espera, enorme, mais parecia um salão de baile com fotos dos artistas da época: Elizabeth Taylor, Montgomery Clift, Clark Gable, Kim Novak, Marlon Brando, etc. Todos ficavam ali a espera do gongo. Naquele tempo soavam três vezes antes da sessão. Aos poucos o mundo real ia desaparecendo e todos mergulhavam na fantasia, paixão e imaginação que o cinema proporciona.
Passaram-se os anos o jovem russo faleceu nos anos sessenta e deixou grandes negócios para os filhos que, com muita competência, ampliaram o capital e hoje são dos maiores empresários do país.
Permaneceu também com os filhos aquela febre da magia do cinema. A população de Mogi, surpresa, viu nos últimos anos fecharem o único cinema que havia na cidade, situado no Mogi Shopping. O jovem cinéfilo pensou – Mogi com trinta mil habitantes tinha três cinemas. Agora com quinhentos mil não tem nenhum. O novo cinema do Shopping não tem previsão para funcionar. Isso certamente o deixou muito triste. Mogiano da gema, que sempre foi, pensou... Preciso tomar uma atitude. Dias depois, pasmem cidadãos de Mogi... Comprou o Shopping. A população toda saudou o negócio como a grande chance da cidade ter novamente o seu cinema. Não sei se esse foi o maior motivo, entretanto, conhecendo o seu amor pela cidade e o seu empreendedorismo acredito que deve ter tido um grande peso em sua decisão.
Por causa desse grande mogiano, por seu pai ter se distraído na estação de Jacarei, justifica-se o título de nossa crônica... SORTE DE MOGI DAS CRUZES!!!
ARMANDO SÉRGIO DA SILVA

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